“… escrever sobre o Abril, sobre o mês da revolução, sobre o dia dos cravos… recordar o passado, ano da inversão, naquele longínquo 1 974, fim duma ditadura, início dum sonho, duma utopia, do que se chama democracia, para mim e agora, seria uma grande tentação!!!...”
… não esqueço, mantenho o que sempre pensei a respeito, nem quero lembrar o antes, aqueles tempos de escuridão, de guerras no Ultramar, de polícia política, a PIDE de má memória, a perseguição dos que divergiam do instituído, a censura nos escritos, nos pensares, o isolamento em que vivíamos, apartados de todos… orgulhosos, tal como alguns tontos ainda ambicionam, pelo que lhes vou lendo, não sabendo distinguir porque, para bem deles, não viveram nessas alturas, não foram vítimas!!!... Que tristeza ser usado como uma coisa qualquer, ser atirado para uma guerra injusta, sendo pacífico e contra elas, perder, dum momento para o outro, a sua identidade… passar a ser carne para canhão, simplesmente!!!... Sei do que falo, passei por isso… fui tropa à força, ao longo de quatro anos da minha vida, dois no Continente e… outros dois, na Guiné!!!... Não me senti cómodo, antes pelo contrário!!!... Diga-se, de passagem, que a minha formação e conhecimentos eram os da época, mui reduzidos, escassos, só lia o que me deixavam ler, só sabia o que eles entendiam que deveria saber, a liberdade era e foi sempre, ao longo dessa noite imensa, inexistente!!!... Pensamento único, forçado, está bom de ver, ainda por cima… com declarações e juras anticomunistas, podem crer!!!... Mesmo que tivéssemos ideias próprias, que tentássemos saber algo mais do Mundo que nos rodeava, esforços vãos… éramos avisados que corríamos riscos, sabíamos que as nossas vidas estavam por um fio, controladinhos da Silva, que não podíamos sair da norma, uma carneirada perfeita e sem jeito algum!!!... Sofri na pele, no espírito, fui obrigado a jurar o que não entendia, na altura… que fartura, minha e de todo um Povo subjugado!!!...
… estávamos fartos, tristes e pobres, isolados… sob a pata do Botas, do Marcelo, seu sucessor, com guerras no Ultramar, com resultados drásticos, em mortos, em estropiados!!!... Pior ainda, mortos de pensamento… salvo raras excepções, os perseguidos políticos, massacrados no corpo, sujeitos a sevícias de arrepiar!!!...
“… escrever sobre o Abril, sobre o mês da revolução, sobre o dia dos cravos… recordar o passado, o ano da inversão, naquele longínquo 1 974, fim duma ditadura, início dum sonho, duma utopia, do que se chama democracia, para mim e agora, seria uma grande tentação!!!...”
… repito porque sinto, como verdade absoluta, o que escrevo… porque tantos o fizeram, em prosa, em poesia, senhores avultados das letras, dos saberes, cantos e lamentos, esperanças e hinos, sinais que auguravam promessas que se não cumpriram na totalidade, como desejávamos, como pretendíamos, a tal sociedade solidária e justa, fraterna, através daquele exemplo extraordinário, uma revolução e um cravo, vermelho retinto!!!... Escrevo e afirmo, casual… flor da época, símbolo escolhido num País de brandos costumes, formação excelsa, sem tiros, nem mortos… alguns dissabores, alguns amargores, fugas em barda, expropriações descontroladas, Verão quente, ameaça constante, tudo repentes, ódios vomitados, gritos e berros, muitos temores!!!... Andámos aos zigues, aos zagues, fomos aprendendo, ainda estamos aprendendo… mantemos imperfeições, gozamos do que temos, acabaram-se as guerras, falamos do que queremos, escrevemos como entendemos, lemos o que não podíamos, somos nós mesmos… com inteira liberdade, embora pobres, na sua grande maioria!!!... Benesses e mordomias, abusos de facto… para políticos de ocasião, para espertos de eleição, muita promiscuidade, bastante corrupção que, com o tempo, se irão diluindo, por vergonha de quem as pratica, por justiça mais eficaz, quando capaz!!!...
… já passaram trinta e poucos anitos, desde então… com tanta criação, com tanta imaginação, montes e montes de escritos de exaltação, tanto em prosa, como em poesia!!!... Somos assim… uns sonhadores!!!...
“… escrever sobre o Abril, sobre o mês da revolução, sobre o dia dos cravos… sobre o 25 de Abril de 1 974, seria tentação!!!...”
… claro que recordo, tenho e mantenho boas recordações, como outras… ingratas e sujas, nódoas aproveitadoras das liberdades que lhes deram, os desenrascados do costume, os que regressaram dos Brasis, de outras partes do Mundo… para onde fugiram quando as coisas estavam mais quentes, pobres e tristes gentes, alguns disfarçados, por cá se mantiveram, estão acordando, quando invectivam, depreciam aquilo que foi, aquilo que é, aquilo que continua sendo… grande acontecimento, amargura dum POVO, libertação total, quebra das grelhas, sonho lindo, risonho, alguma desilusão, vendo as coisas como estão!!!... Alguns bocatas se rebelam, quando impõem, quando rejeitam, quando temem uma flor… vermelha que seja, que atribuem a um partido, o que é de todos, sem excepção!!!... Variadas maneiras de pensar a vida, de fazer a política, das esquerdas extremadas, passando por todos os quadrantes… às direitas de antes, extremadas e vingativas, odientas, até… alguns dos frutos que se colheram desse dia, gratos que deveriam estar, em lugar de contestar tal data, quão pataratas que são!!!... Não os entendo, desmereço-os, enjeito-os, rejeito-os… do coração, pela hipocrisia, pela mania, pelos ódios, pelas guerras que apoiam, pois então!!!... Quão agradecidos deveriam estar pelo acontecido naquele dia… graças a ele, às amplas liberdades, chegaram onde estão, têm tudo na mão, menos o cravo vermelho, verdadeiro cravo na garganta, que os emperra, que os espanta, que os atemoriza, quiçá!!!... O cravo, o Abril… como sempre, estão presentes, embora alguns tontos, os rejeitem!!!...
“… escrever sobre o Abril, sobre o mês da revolução… seria tentação!!!...” Sherpas!!!...
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